No conforto do meu carro, ao som de uma música suave, estaciono e, enquanto bebo um gole de água fresca, observo próximo dali uma folha seca, aliás, concluí pelo cenário devastado pelo fogo que se tratava de uma das últimas folhas que sobraram. Causa evidente do fogo ardente que devastara aquela região, provavelmente há poucas horas, a julgar pelo aspecto. Então, abro a janela do carro e sinto uma ardência na garganta. Me dou conta de que sou a única testemunha do controverso instante da chegada de um vento gelado, um sopro que bateu sem dó nem piedade no meu rosto, mas não me machucou tanto como o que estava por vir.
Eis então que por ali o frio dera o seu ar da graça e chegara para aliviar o calor ainda contido na terra, devido ao fogo recente e com a proposta de levar para longe toda aquela fumaça sufocante. Com o gosto amargo na garganta, efeito da fumaça, impossível não sentir o cheiro da carne de animais silvestres que não tiveram a mínima chance de fugir, fugir... Fugir para onde? Se não há mais mata ao redor! Tomado por um sentimento de culpa, enquanto os olhos lacrimejavam convenientemente em consequência da fumaça, percebi um movimento. Meus olhos atentos captaram o golpe de misericórdia que culminou no derradeiro ato daquela que dedicou uma vida inteira de serviços prestados à humanidade, sem nunca ter recebido nada em troca. Quantas dificuldades enfrentara para sobreviver, testemunhou muitas partidas, muitas chegadas... Ah! A primavera. Esta seria sua melhor, com certeza.
Ela se sentia mais viva do que nunca, na flor da idade, tinha um ciclo todo de vida pela frente. Mas se viu indefesa, após ser golpeada pela força do vento, e é bom que se diga, ele não tem culpa neste final trágico. Pois fez apenas o que tinha que fazer, ventar, seguir em frente, para o lado, voltar, soprar... A direção não importa, e sim o movimento. E o movimento foi abrupto. A folha partiu, sem despedidas, apenas se deixou levar pelo vento. Eu, parado ali, não tive dúvidas, me apressei em tirar uma selfie.
Entrei no carro, liguei o ar condicionado, porque ninguém merece respirar essa fumaça, coloquei meu Pen Drive de modão e segui meu caminho, cortando o vento, sem culpa e nem pedir desculpas, pois somos seres humanos. E por que se preocupar com uma folha seca?! Afinal, amor é fogo que arde sem ver... Sem se ver, que a natureza morre! Onde está esse tal amor?
Assinado: "Ser...humano".
Autor: Demetrinho Arruda
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Acabei de ler Demétrio... Parabéns! Compartilhar do sentimento seco e quente das tuas palavras me faz arder na culpa do desamor gelado de nós, frios seres humanos... desalmados como as folhas secas.
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